Pejotização

O termo “pejotização” passou a ser conhecido como o ato de manter colaboradores mediante a criação de uma pessoa jurídica distinta, que passa a trabalhar para a empregadora, sem vínculo empregatício.

Se, de um lado, há quem diga que a contratação de um colaborador, que equivocadamente sempre é visto como hipossuficiente, mediante interposta pessoa jurídica acarreta numa maquiagem a relação de trabalho, suprimindo-lhe a proteção legal, é inegável o ganho para ambas as partes nesssa relação.

Isto porque, embora a contratante deixe de recolher INSS, FGTS e esteja dispensada do pagamento de Férias e Décimo, entre outros encargos, o colaborador, agora contratado via PJ, igualmente deixa de recolher sua cota-parte do INSS e não tem retido o IR em seu pagamento.

Além disso, o mercado vem demonstrando que, em referidas contratações, geralmente via “MEI”, são embutidos todos os encargos que o colaborador teria direito a receber se contratado com vínculo empregatício, como uma compensação pelos hipotéticos “direitos” renunciados. Então, na maior parte das vezes, a contratante paga à PJ contratada valor superior àquele que seria pago ao empregado celetista.

Ademais, com o amadurecimento desse tipo de relação, as partes passaram a negociar as cláusulas contratuais como: horas e períodos trabalhados, local de trabalho, remuneração diferenciada, entre outros benefícios, que, muitas vezes, não seriam possíveis para um colaborador com vínculo empregatício.

Inclusive, algumas empresas passaram a se deparar com a exigência por parte dos próprios contratados, desse modelo. O que não seria crível, se não houvesse um ganho efetivo para os mesmos.

Recentemente o STF se deparou com esse tipo de relação jurídica, em uma ação em que o MPT exigia que os contratos de diversos médicos, via suas interpostas pessoas jurídicas, fossem anulados e, consequente, reconhecido o vínculo direto de emprego com a contratante.

Nesse contexto, o STF entendeu pela licitude da contratação do hipersuficiente como pessoa jurídica e, nas palavras do Ministro Alexandre de Moraes, […] já venho me manifestando em inúmeros casos na turma sobre a licitude terceirização da atividade fim, que aqui eu considero existente.” […] “É por se tratar aqui, da licitude da questão da contratação de médicos por entidades sem fins lucrativos. […] aqui me parece que é exatamente o caso específico da possibilidade dessa contratação sem que com isso se coloque uma ilicitude na contratação e sabemos que isso ocorre, não só na questão médica, mas em inúmeras outras atividades, dentro dessa possibilidade de permitir a prestação de serviços e terceirização lícita da atividade-fim, não podendo ser penalizado […]”

De fato, ao longo dos anos, o Supremo Tribunal Federal vem validado esse tipo de pacto em diversos setores da economia. Em 2016, decidiu pela validade da lei 13.352/16, que dispõe sobre o contrato de parceria entre os profissionais que exercem as atividades de Cabeleireiro, Barbeiro etc. e pessoas jurídicas registradas como salão de beleza. A lei acrescentou o artigo 1º-A à lei 12.592 e seu parágrafo 11 é claro ao preceituar que “o profissional-parceiro não terá relação de emprego ou de sociedade com o salão-parceiro […] “.

No mesmo caminhar, o STF julgou procedente a ADC 48/20 declarando a constitucionalidade da lei 11.442/07, bem como firmou a tese no sentido de que, preenchidos os seus requisitos, fica afastada a configuração do vínculo empregatício para a contratação de autônomos para a realização do TRC – Transporte Rodoviário de Cargas.

Em dezembro de 2020, declarou a constitucionalidade do artigo 129 da Lei 11.196/2005 – ADC 66, que permite a aplicação do regramento de pessoas jurídicas à prestação de serviços intelectuais, inclusive os de natureza científica, artística ou cultural.

A discussão, longe de ser pacífica, tem como ponto central a hipo ou hipersuficiencia do colaborador, já que o direito do trabalho existe para a proteção do trabalhador, cujos direitos são irrenunciáveis e de ordem pública. Outrossim, a contratação via PJ é lícita e vai ao encontro do princípio da autonomia da vontade.

De todo modo, fica claro que algumas atividades podem ser “pejotizadas”, principalmente aquelas que exigem profissionais técnicos, ou com certo grau de instrução, os denominados hipersuficientes.